“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava junto de Deus e o Verbo era Deus”. (Jo 1,1)
Deus cria, e a Sua criação se dá por Cristo, com Cristo e em Cristo. Dizer que “no princípio era o verbo” é afirmar não somente que Cristo estava desde sempre, mas, nas palavras do evangelista, vemos a vocação de toda a criação, qual seja ser plena em Cristo. Quando Deus manda/ordena (Gn 1, 3.6.9.11.14.20.24.26) e a criação ocorre, percebemos que Deus cria o mundo por Seu Verbo, isto é, por sua Palavra.
Por isso a criação do mundo tem de ser vista a luz da própria escatologia[1]. Pois Cristo se encerra em tudo, e sua presença, na “plenitude dos tempos” (Gl 4, 4), vai explicar e remir a criação.
Sendo assim, se no princípio “tudo era bom” (Gn 1, 10.12.18.21.25), quem melhor que o próprio Cristo com o qual tudo foi feito e sem o qual nada foi criado (Jo 1, 3), para nos remeter novamente a condição inicial de “imagem e semelhança” de Deus (Gn 1, 26).
JESUS, EXALTADO PELO PAI
“E do céu baixou uma voz: Eis meu Filho muito amado em quem ponho minha afeição” (Mt 3,17).
Inicialmente se deve ter em conta que nenhum dos profetas nunca imaginou que o Messias seria o próprio verbo encarnado. Os fariseus e os escribas se indignaram com as revelações de Jesus se igualando ao “EU SOU” de Javé (Jo 8, 58 c/c Ex 3, 14), tendo em outro momento o Sumo Sacerdote da época rasgado sua roupa em sinal de escândalo (Mt 26, 63-64). Também era absurda a idéia da vinda de um Messias que, como Rei, não subjugasse os opressores. Sendo assim, é o Pai que, exaltando o filho, revelou a sua realeza (Mt 16, 13-17).
Deste fato não há verdade maior. Tendo o Pai feito o plano de salvação, guardou a glória de seu Filho em acontecimentos inimagináveis. Tudo que Cristo é se resume bem na frágil imagem do cordeiro. E que surpresa é saber o que esse cordeiro é capaz de fazer escatológicamente (Ap 6, 16) não só pelo povo eleito, mas por todo o universo, como diz São Justino[2]:
“Nós recebemos o ensinamento de que Cristo é o primogênito de Deus e indicamos antes que ele é o Verbo, do qual todo o gênero humano participou. Portanto, aqueles que viveram conforme o Verbo são cristãos, quando foram considerados ateus, como sucedeu entre os gregos com Sócrates, Heráclito e outros semelhantes; e entre os bárbaros com Abraão, Ananias, Azarias e Misael, e muitos outros, cujos fatos e nomes omitimos agora, pois seria longo enumerar”[3].
Temos hinos cristológicos lindos que indicam duas verdades:
I – O próprio Deus na pessoa de seu Filho (que é Deus de Deus e Luz da Luz) despoja-se de sua divindade encarnando-se na nossa humanidade;
II – Cristo eleva-nos a um status verdadeiramente humano, tirando-nos da condição de Adão (pecado Original) e devolvendo-nos a condição de Imagem e Semelhança.
Em Jesus a criação, toda ela, atualiza de modo concreto e definitivo sua forma mais perfeita de existência, seu “ser de Deus” e seu “alcançar a Deus”. Daí a conclusão de que o homem só, verdadeiramente, existirá integralmente quando chegar a Deus[4]. Sendo Jesus a “imitação” perfeita do Pai, e entendendo-se por imitação tornar-se presente, neste sentido Jesus torna presente Deus no meio dos homens.
E aqui entra o mistério do menino que nasce em uma pequena gruta em Belém. E nasce justamente para ser o Emanuel (Mt 1, 23). O numero 525 do Catecismo nos diz que “a terra oferece uma gruta ao inacessível”.
De fato, antes de Cristo, Deus nos é inacessível... mas Cristo nasce, e ao nascer faz uma troca com cada um de nós: Ele assume a nossa natureza humana, com todas as fragilidades e necessidades que temos, e, em troca, nos doa a sua própria divindade. As Glórias e Virtudes de Deus nos fazem “participantes da natureza divina” (1Pd, 3-4) não de forma abstrata ou filosófica, mas de forma real, concreta.
O Filho do Homem nos faz Filhos de Deus.
Tudo isto num simples nascimento. Em uma simples gruta, presente da terra “vós [Jesus] nascestes por nós, Menino, Deus eterno!”[5]
Que possamos refletir estas realidades neste Natal. Que o nascimento do Verbo Eterno seja concreto em nós, e que nós possamos permitir que neste “admirável intercâmbio”, possamos participar de sua glória.
Apesar da redundância,
Um Natal em Cristo para todos.
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