segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

A mensagem natalícia "Urbi et Orbi" e as saudações de natal do Papa Bento XVI

Conforme retirado do site zenit (http://www.zenit.org), a publicação do texto da tradicional mensagem natalina, “Urbi et Orbi”, dirigida por Bento XVI diretamente da Cidade do Vaticano no domingo, 25 de dezembro de 2011, aos fiéis presentes na praça de São Pedro e a todo o mundo por meio da radio e da televisão.

Amados irmãos e irmãs de Roma e do mundo inteiro!

Cristo nasceu para nós! Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens do seu agrado: a todos chegue o eco deste anúncio de Belém, que a Igreja Católica faz ressoar por todos os continentes, sem olhar a fronteiras nacionais, linguísticas e culturais. O Filho de Maria Virgem nasceu para todos; é o Salvador de todos.

Numa antífona litúrgica antiga, Ele é invocado assim: «Ó Emanuel, nosso rei e legislador, esperança e salvação dos povos! Vinde salvar-nos, Senhor nosso Deus». Veni ad salvandum nos! Vinde salvar-nos! Tal é o grito do homem de todo e qualquer tempo que, sozinho, se sente incapaz de superar dificuldades e perigos. Precisa de colocar a sua mão numa mão maior e mais forte, uma mão do Alto que se estenda para ele. Amados irmãos e irmãs, esta mão é Cristo, nascido em Belém da Virgem Maria. Ele é a mão que Deus estendeu à humanidade, para fazê-la sair das areias movediças do pecado e segurá-la de pé sobre a rocha, a rocha firme da sua Verdade e do seu Amor (cf. Sal 40, 3).

E é isto mesmo o que significa o nome daquele Menino (o nome que, por vontade de Deus, Lhe deram Maria e José): chama-se Jesus, que significa «Salvador» (cf. Mt 1, 21; Lc 1, 31). Ele foi enviado por Deus Pai, para nos salvar sobretudo do mal mais profundo que está radicado no homem e na história: o mal que é a separação de Deus, o orgulho presunçoso do homem fazer como lhe apetece, de fazer concorrência a Deus e substituir-se a Ele, de decidir o que é bem e o que é mal, de ser o senhor da vida e da morte (cf. Gn 3, 1-7). Este é o grande mal, o grande pecado, do qual nós, homens, não nos podemos salvar senão confiando-nos à ajuda de Deus, senão gritando por Ele: «Veni ad salvadum nos – Vinde salvar-nos!»

O próprio facto de elevarmos ao Céu esta imploração já nos coloca na justa condição, já nos coloca na verdade do que somos nós mesmos: realmente nós somos aqueles que gritaram por Deus e foram salvos (cf. Est (em grego) 10, 3f). Deus é o Salvador, nós aqueles que se encontram em perigo. Ele é o médico, nós os doentes. O facto de reconhecer isto mesmo é o primeiro passo para a salvação, para a saída do labirinto onde nós mesmos, com o nosso orgulho, nos encerramos. Levantar os olhos para o Céu, estender as mãos e implorar ajuda é o caminho de saída, contanto que haja Alguém que escute e possa vir em nosso socorro.

Jesus Cristo é a prova de que Deus escutou o nosso grito. E não só! Deus nutre por nós um amor tão forte que não pôde permanecer em Si mesmo, mas teve de sair de Si mesmo e vir ter connosco, partilhando até ao fundo a nossa condição (cf. Ex 3, 7-12). A resposta que Deus deu, em Cristo, ao grito do homem, supera infinitamente as nossas expectativas, chegando a uma solidariedade tal que não pode ser simplesmente humana, mas divina. Só o Deus que é amor e o amor que é Deus podia escolher salvar-nos através deste caminho, que é certamente o mais longo, mas é aquele que respeita a verdade d’Ele e nossa: o caminho da reconciliação, do diálogo e da colaboração.

Por isso, amados irmãos e irmãs de Roma e do mundo inteiro, neste Natal de 2011, dirijamo-nos ao Menino de Belém, ao Filho da Virgem Maria e digamos: «Vinde salvar-nos»! Repitamo-lo em união espiritual com tantas pessoas que atravessam situações particularmente difíceis, fazendo-nos voz de quem a não tem.

Juntos, invoquemos o socorro divino para as populações do Nordeste da África, que padecem fome por causa das carestias, por vezes ainda agravadas por um estado persistente de insegurança. A comunidade internacional não deixe faltar a sua ajuda aos numerosos refugiados vindos daquela Região, duramente provados na sua dignidade.

O Senhor dê conforto às populações do Sudeste asiático, particularmente da Tailândia e das Filipinas, que se encontram ainda em graves situações de emergência devido às recentes inundações.

O Senhor socorra a humanidade ferida por tantos conflitos, que ainda hoje ensanguentam o Planeta. Ele, que é o Príncipe da Paz, dê paz e estabilidade à Terra onde escolheu vir ao mundo, encorajando a retoma do diálogo entre israelitas e palestinianos. Faça cessar as violências na Síria, onde já foi derramado tanto sangue. Favoreça a plena reconciliação e a estabilidade no Iraque e no Afeganistão. Dê um renovado vigor, na edificação do bem comum, a todos os componentes da sociedade nos países do Norte da África e do Médio Oriente.

O nascimento do Salvador sustente as perspectivas de diálogo e colaboração no Myanmar à procura de soluções compartilhadas. O Natal do Redentor garanta a estabilidade política nos países da região africana dos Grande Lagos e assista o empenho dos habitantes do Sudão do Sul na tutela dos direitos de todos os cidadãos.

Amados irmãos e irmãs, dirijamos o olhar para a Gruta de Belém: o Menino que contemplamos é a nossa salvação. Ele trouxe ao mundo uma mensagem universal de reconciliação e de paz. Abramos- Lhe o nosso coração, acolhamo-Lo na nossa vida. Repitamos-Lhe com confiada esperança: «Veni ad salvandum nos».

Depois da sua mensagem, o Papa enviou a saudação natalícia em 65 línguas, entre as quais:
A todos os que me escutam, envio-lhes uma cordial saudação nas diversas expressões linguísticas:

portoghese:
Feliz Natal para todos, e que a Luz de Cristo Salvador ilumine os vossos corações de paz e de esperança!

[© Copyright 2011 - Libreria Editrice Vaticana]

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

O NATAL É DO PRIMOGÊNITO DE TODA A CRIAÇÃO


No princípio era o Verbo, e o Verbo estava junto de Deus e o Verbo era Deus”. (Jo 1,1)

Deus cria, e a Sua criação se dá por Cristo, com Cristo e em Cristo. Dizer que “no princípio era o verbo” é afirmar não somente que Cristo estava desde sempre, mas, nas palavras do evangelista, vemos a vocação de toda a criação, qual seja ser plena em Cristo. Quando Deus manda/ordena (Gn 1, 3.6.9.11.14.20.24.26) e a criação ocorre, percebemos que Deus cria o mundo por Seu Verbo, isto é, por sua Palavra.

Por isso a criação do mundo tem de ser vista a luz da própria escatologia[1]. Pois Cristo se encerra em tudo, e sua presença, na “plenitude dos tempos” (Gl 4, 4), vai explicar e remir a criação.

Sendo assim, se no princípio “tudo era bom” (Gn 1, 10.12.18.21.25), quem melhor que o próprio Cristo com o qual tudo foi feito e sem o qual nada foi criado (Jo 1, 3), para nos remeter novamente a condição inicial de “imagem e semelhança” de Deus (Gn  1, 26).

JESUS, EXALTADO PELO PAI

“E do céu baixou uma voz: Eis meu Filho muito amado em quem ponho minha afeição” (Mt 3,17).

Inicialmente se deve ter em conta que nenhum dos profetas nunca imaginou que o Messias seria o próprio verbo encarnado. Os fariseus e os escribas se indignaram com as revelações de Jesus se igualando ao “EU SOU” de Javé (Jo 8, 58 c/c Ex 3, 14), tendo em outro momento o Sumo Sacerdote da época rasgado sua roupa em sinal de escândalo (Mt 26, 63-64). Também era absurda a idéia da vinda de um Messias que, como Rei, não subjugasse os opressores. Sendo assim, é o Pai que, exaltando o filho, revelou a sua realeza (Mt 16, 13-17).

Deste fato não há verdade maior. Tendo o Pai feito o plano de salvação, guardou a glória de seu Filho em acontecimentos inimagináveis. Tudo que Cristo é se resume bem na frágil imagem do cordeiro. E que surpresa é saber o que esse cordeiro é capaz de fazer escatológicamente (Ap 6, 16) não só pelo povo eleito, mas por todo o universo, como diz São Justino[2]:

Nós recebemos o ensinamento de que Cristo é o primogênito de Deus e indicamos antes que ele é o Verbo, do qual todo o gênero humano participou. Portanto, aqueles que viveram conforme o Verbo são cristãos, quando foram considerados ateus, como sucedeu entre os gregos com Sócrates, Heráclito e outros semelhantes; e entre os bárbaros com Abraão, Ananias, Azarias e Misael, e muitos outros, cujos fatos e nomes omitimos agora, pois seria longo enumerar[3].

Temos hinos cristológicos lindos que indicam duas verdades:

I – O próprio Deus na pessoa de seu Filho (que é Deus de Deus e Luz da Luz) despoja-se de sua divindade encarnando-se na nossa humanidade;
II – Cristo eleva-nos a um status verdadeiramente humano, tirando-nos da condição de Adão (pecado Original) e devolvendo-nos a condição de Imagem e Semelhança.

Em Jesus a criação, toda ela, atualiza de modo concreto e definitivo sua forma mais perfeita de existência, seu “ser de Deus” e seu “alcançar a Deus”. Daí a conclusão de que o homem só, verdadeiramente, existirá integralmente quando chegar a Deus[4]. Sendo Jesus a “imitação” perfeita do Pai, e entendendo-se por imitação tornar-se presente, neste sentido Jesus torna presente Deus no meio dos homens.

E aqui entra o mistério do menino que nasce em uma pequena gruta em Belém. E nasce justamente para ser o Emanuel (Mt 1, 23). O numero 525 do Catecismo nos diz que “a terra oferece uma gruta ao inacessível”.

De fato, antes de Cristo, Deus nos é inacessível... mas Cristo nasce, e ao nascer faz uma troca com cada um de nós: Ele assume a nossa natureza humana, com todas as fragilidades e necessidades que temos, e, em troca, nos doa a sua própria divindade. As Glórias e Virtudes de Deus nos fazem “participantes da natureza divina” (1Pd, 3-4) não de forma abstrata ou filosófica, mas de forma real, concreta.
O Filho do Homem nos faz Filhos de Deus.

Tudo isto num simples nascimento. Em uma simples gruta, presente da terra “vós [Jesus] nascestes por nós, Menino, Deus eterno![5]

Que possamos refletir estas realidades neste Natal. Que o nascimento do Verbo Eterno seja concreto em nós, e que nós possamos permitir que neste “admirável intercâmbio”, possamos participar de sua glória.

Apesar da redundância,
Um Natal em Cristo para todos.


[1] Acontecimentos relativos já a vinda final de Jesus;
[2] Século II d.C.;
[3] 1 Apologia 46, 3;
[4] GAUDIUM ET SPES - Sobre a Igreja no Mundo Atual, 19, 1;
[5] Catecismo da Igreja Católica nº 525;

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

A COMUNHÃO EM PECADO.

Eu ia escrever algo sobre o ano litúrgico, mas tendo em vista algumas conversas sobre o tema, acho interessante debater se podemos comungar estando em pecado, se tivermos o firme propósito de nos confessarmos imediatamente após a Missa.

Primeiramente, para que fique claro, não me refiro aqui a comungar tendo cometido pecados veniais, vez que estes são remidos pela própria Missa quando fazemos o ato de contrição, refiro-me a pecados mortais.

Começamos com o questionamento: posso comungar se estiver em pecado mortal?
A resposta é NÃO, conforme preceitua o Código de Direito Canônico (CDC), cânon 916:
“Quem está consciente de pecado grave não celebre a missa [para os sacerdotes ordenados] nem comungue o Corpo Senhor, sem fazer antes a confissão sacramental, a não ser que exista causa grave e não haja oportunidade para se confessar; nesse caso, porém, lembre-se que é obrigado a fazer um ato de contrição perfeita, que inclui o propósito de se confessar quanto antes.

Logo fica claro que a regra é que não se deve comungar em pecado grave, sem antes recorrer a confissão sacramental.

Sabendo qual é a regra, podemos partir para as duas exceções, que formam uma só:
Quem está consciente de pecado grave não (...) comungue (...), sem fazer antes a confissão sacramental, a não ser que exista causa grave e não haja oportunidade para se confessar;

Logo, tendo cometido um pecado grave, só se pode comungar se existir uma causa grave, e que não haja oportunidade para se confessar antes.

Para entender melhor esta questão, conjuguemos o CDC com o Catecismo da Igreja Católica (CIC) no seu artigo 1457, que nos diz:
Conforme o mandamento da Igreja, “todo fiel, depois de ter chegado à idade da discrição, é obrigado a confessar seus pecados graves, dos quais tem consciência, pelo menos uma vez por ano. Aquele que tem consciência de ter cometido um pecado mortal não deve receber a Sagrada Comunhão, mesmo que esteja profundamente contrito, sem receber previamente a absolvição sacramental, a menos que tenha um motivo grave para comungar e lhe seja impossível chegar a um confessor. As crianças devem confessar -se antes de receber a Primeira Eucaristia”.

A título de esclarecimento, podemos definir “motivo grave” fazendo uma analogia com o nº 2154 do CIC que nos diz que um juramento[1] pode ser feito quando ocorrer uma causa grave e justa. S. Paulo, em sua carta a comunidade de Corínto, informa que se não a visitou era para poupá-los de uma tristeza pela exortação pessoal. Para que não ficasse dúvidas ele Jura, pois assim não se perderá a comunidade. Isso é um motivo grave, por exemplo: perder alguém na fé.

Sendo assim é preciso o motivo grave (ex. uma Padre que nunca celebra a divina Eucaristia pode fazer os fiéis se perderem da fé), e que lhe seja impossível confessar os pecados. Salvo isso, a simples contrição do coração não é justificativa para comungar em pecado.

Importante que o CIC nº 1452 fala que uma contrição perfeita, que é a “dor da alma e detestação do pecado cometido, com a resolução de não mais pecar no futuro” tem o poder de perdoar as faltas veniais e os pecados mortais, se vier acompanhada do firme propósito de se recorrer, quando possível, à confissão sacramental.

Logo caberia a pergunta “mas então se eu estou profundamente arrependido do meu pecado de toda a minha alma, tendo o propósito de me confessar assim que possível, não posso então comungar?
A resposta continua sendo não porque o CIC é bem claro quando diz que “Aquele que tem consciência de ter cometido um pecado mortal não deve receber a Sagrada Comunhão, mesmo que esteja profundamente contrito”. Salvo nas exceções afirmadas.

Geralmente usamos de expedientes para comungarmos em pecado para logo após a Santa Missa procurarmos o padre para pedirmos a absolvição. Ora, se você já está na missa e quer comungar, espere a Santa Missa acabar, receba o sacramento da penitência e comungue na próxima Santa Missa, ou então procure o sacerdote antes.

Até porque dificilmente pecaremos 5 minutos antes da celebração. Geralmente estamos em pecado durante a semana toda e não vamos até o sacerdote.

No final das contas, se analisarmos bem este desejo de comungar não é contrição, mas simples remorso.
Quem quer receber a Cristo na comunhão eucarística deve estar em estado de graça” (CIC 1415), vez que Deus é luz, onde não pode coabitar nenhuma treva (1Jo 1,5). Tenhamos muito cuidado e respeito pelo Santíssimo corpo do Nosso Senhor Jesus Cristo.

Aquele que o come e o bebe sem distinguir o corpo do Senhor, come e bebe a sua própria condenação”. (1Cor 11, 29)

Possamos ir de cabeça erguida até Cristo e, de forma muito humilde, como fez o Centurião, com uma fé esponsal, dizer “Domine, non sum dignus ut mires sub tectum meum sed tantum dic verbo et sanabitur anima mea - Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha morada, mas dizei uma palavra e serei salvo”.


[1] Este número do CIC esclarece o porquê S. Paulo jura em que pese Jesus ter recomendado não jurar em Mt 5, 34-37;