terça-feira, 26 de janeiro de 2010

CREIO EM DEUS PAI TODO PODEROSO ...


Durante a história da salvação a definição de Deus carrega uma dualidade extremamente contraditória. Deus é amor (Isaías 66, 13), mas vingativo (Êxodo 20, 5; Deuteronômio 5, 9) e até cruel (Isaías 14, 30). Talvez uma boa definição no Antigo testamento seja a do salmista que diz “Como um pai tem piedade de seus filhos, assim o Senhor tem compaixão dos que o temem” (Salmo 102[103] 13).
Contudo, vemos, apesar disto, um desejo impar de contemplá-lo (Salmos 42[41], 3), mesmo que se ache impossível (Êxodo 33, 18-23) dado a sua grandiosidade e santidade(Gênesis 32, 30[31]).
Estas definições de Deus parecem ir de encontro a este trecho do Credo. Como pode Deus ser Pai se nem “podemos” contemplar sua face? Como pode um Pai ser, às vezes, tão distante?
Deus é Pai, inicialmente por que é Deus dos patriarcas, tanto que diz a Moisés na sarça ardente “Eu sou(...) o Deus de teu pai, o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacó”. Se demonstra um Deus presente, que sempre caminhou com o povo.
Aqui vislumbramos que apesar de ter sempre caminhado com o povo, Sua “personalidade” foi sendo conhecida aos poucos. Comparativamente o Deus que Cristo apresenta é muito diferente do Deus no antigo testamento, e muitas pessoas tem dificuldade de entender o por quê. Parece que Deus mudou quando, na verdade, passamos a “conhecê-lo” melhor. “Ao longo dos séculos, a fé de Israel pôde desenvolver e aprofundar as riquezas contidas na revelação do nome divino”[1].
Deus também é Pai quanto a sua ternura, compaixão e misericórdia (Carta aos Efésios 2, 4), que já era vislumbrada pelos profetas (Êxodo 34, 6). Deus ama Israel (amor que se estende a todos os povos) com um amor gratuito (Deuteronômio 4, 37; 7, 8; 10, 15), Eterno (Isaías 54, 8; Jeremias 31, 3). Novamente esta definição não se contradiz com o Deus cruel que mostrei no início do texto. Apenas corrobora que a percepção de Deus vai fazendo com que o vislumbremos melhor. São Paulo muito bem diz que “Hoje vemos como por um espelho, confusamente; mas então veremos face a face. Hoje conheço em parte; mas então conhecerei totalmente, como eu sou conhecido”. Aliado a isso, temos João que não define o Pai como alguém que ama, mas como sendo essencialmente amor (I João 4, 8.16).
Também sabemos que temos Deus por Pai pois assim Cristo disse na oração do Pai Nosso (Mateus 6, 9).  Na autoridade de Verbo de Deus (João 1, 1), Cristo nos outorga o direito de chamar Deus de Pai.
Acima destas três definições, que não tem caráter de ser taxativas, esta a afirmativa de que “Deus é pai não somente enquanto Criador, mas é eternamente Pai em relação a seu Filho único, que só é eternamente Filho em relação a seu Pai: "Ninguém conhece o Filho senão o Pai, e ninguém conhece O Pai senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar" (Mateus 11, 27)”[2].
Não há como aprofundar na filiação de Cristo sem se interar na Santíssima Trindade. Isso nós faremos em um momento posterior.
Deus também é todo poderoso devido a sua onipotência. “Nós cremos que ela [a onipotência de Deus] é universal, pois Deus que criou tudo (Genesis 1, 1; João 1, 3), governa tudo e pode tudo, é também de amor, pois Deus é nosso Pai; e é misteriosa, pois somente a fé pode discerni-la, quando (a onipotência divina) "se manifesta na fraqueza" (2Cor 12,9)[3].
Sendo Deus Todo-poderoso “no céu e na terra” (Salmo 134[135], 6), Ele ordena todas as coisas segundo a sua vontade.  Em Deus a palavra CRIAÇÃO tem seu significado pleno, vez que só Ele cria do nada. Nós até podemos fazer um invento, mas não estaremos criando, tendo em vista termos que usar matéria prima para obtermos êxito. Na verdade nós adaptamos os materiais para a finalidade que almejamos.  Mas na filosofia[4] vemos a existência da CAUSA DAS CAUSAS NÃO CAUSADAS ou CAUSA INCAUSADA.
Basicamente é assim: Toda a Causa é anterior ao seu efeito. E isso é um fato irrefutável para a filosofia vez que podemos pensar em algo, mas esse algo terá que ter uma causa anterior. Dou como exemplo um resfriado causado pela chuva que é causada pela evaporação que é causada pelo Sol. Se paramos no Sol duas possibilidades ocorrem:
1-      O Sol sempre existiu (logo ele é causa de si mesmo);
2-      O Sol nem sempre existiu (teríamos que descobrir a causa da sua existência);
Se a ciência diz que tudo tem uma causa, ela irá se contradizer a si mesma se não afirmar que haja uma causa primeira.
Junto a esta teoria temos a teoria do SER NECESSÁRIO. O que não existe não começa a existir se não mediante outrem [que já exista]. Seguindo esta linha de raciocínio filosófico vislumbramos novamente duas possibilidades:
1-      Há um processo ad infinitum  de seres criadores;
2-      Há UM SER que tenha em SI MESMO a necessidade de existir, SEM RECEBÊ-LA DE OUTRO;
Este ser necessário, absoluto, é Deus que não pode deixar de existir ou mesmo deixar de ser Deus, sob a conseqüência de passar a ser contingente, dependente. Ele é o ser necessário em virtude do qual os seres contingentes tem existência. (quanto as 5 vias, deixo para aprofundar o tema em um momento posterior).
Não estou afirmando que a onipotência de Deus venha destes dois conceitos, apenas estou dando explicações racionais para a razão de se dizer que Deus é onipotente.
No credo o parágrafo é lido junto. Não temos alguém que é pai e é todo poderoso mais sim um PAI TODO PODEROSO conforme é dito no livro da sabedoria 11, 23[24]:
“TENDES COMPAIXÃO DE TODOS, PORQUE VÓS PODEIS TUDO”
Logo sua onipotência e paternidade iluminam-se mutuamente. E isto nos fará crer no restante do Credo que será ainda abordado.
Aqui, nós como igreja rezamos ao "Deus Todo-Poderoso e eterno" ("omnipotens sempiterne Deus..."), crendo firmemente que "nada é impossível a Deus" (Lucas 1, 37)[5]. Bem sabemos que muitas vezes Deus aparentemente não se manifesta, mas “Deus manifesta sua onipotência convertendo-nos dos nossos pecados e restabelecendo-nos em sua amizade pela graça ("Deus, qui omnipotentiam tuam parcendo maxime et miserando manifestas...  - O Deus, que manifestais o vosso poder sobretudo na misericórdia")[6].

Até a próxima
A Paz de Cristo que é a nossa Paz.





[1] Catecismo da Igreja Católica nº 212;
[2] Catecismo da Igreja Católica nº 240;
[3] Catecismo da Igreja Católica nº 268;
[4] A CAUSA INCAUSADA e O SER NECESSÁRIO são duas das 5 vias da prova da existência de Deus de Santo Tomás de Aquino. Esse pensamento filosófico já tem início em Sócrates e Aristóteles;
[5] Catecismo da Igreja Católica nº 276;
[6] MISSAL ROMANO coleta do 26º domingo;

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Eu Creio ...

Este Símbolo [o Credo] é o selo espiritual, a meditação do nosso coração e o guardião sempre presente; ele é, seguramente, o tesouro da nossa alma”.
(Santo Ambrósio (340´397), bispo de Milão e doutor da Igreja)

No dia 11 de janeiro a liturgia nos apresentou o batismo de Jesus (Isaías 42, 1-4.6-7; Salmo 28[29]; Atos 10, 34-38; Lucas 3, 15-16.21-22). Ao apresentar este batismo a liturgia nos faz refletir nosso próprio batismo na profissão de fé, onde renovamos os compromissos batismais.

Quando Deus revela-se ao homem, lhe dá a oportunidade de acolhê-Lo e tributar-Lhe toda a sua fé. A profissão de fé de todos os cristãos é feita na primeira pessoa do singular: “Creio”. Porque, no seio da comunidade, cada pessoa tem sua própria história com Deus. Ninguém pode dizer por outro: Creio.

Interessante que o compromisso batismal é baseado em renuncias (as três primeiras partes) e no credo.

Mas, inicialmente, o que é o credo?

Credo é a síntese da fé cristã. Esta síntese chama-se “profissão de fé” pois nela se condensa tudo o que os cristãos professam. Tanto que o catecismo da Igreja católica no seu número 185 assevera que “Quem diz “Creio” afirma: “dou a minha adesão àquilo em que nós cremos””.

O nome “credo” vem da primeira palavra com a qual, normalmente começam, qual seja “creio”. Ele tem também como denominação “símbolo da fé”.

Símbolo aqui não no sentido de uma figura ou imagem que representa algo abstrato. Mas do grego “symbolon” que significa a metade de um objeto quebrado, a ser apresentado como sinal de reconhecimento .

Li no livro PORTÕES DE FOGO que os espartanos usavam algo bem parecido quando iam para a guerra. Traçavam seus nomes ou sinais em um bracelete improvisado, feito de galhos, que chamavam de “etiquetas”, e identificaria os corpos, caso muito mutilados. Cada símbolo partido significava um guerreiro. Assim saberiam quem voltou e quem morreu. Uma metade não era nada, e significava, na melhor das hipóteses um desaparecido, mas geralmente era sinal de morte.

O Credo também é partido, quebrado:

Creio em Deus Pai Todo-Poderoso, criador do céu e da terra.

Creio em Jesus Cristo, seu único Filho, nosso Senhor, que nasceu da Virgem Maria, padeceu e foi sepultado, ressuscitou dos mortos e subiu ao céu.

Creio no Espírito Santo, Senhor e fonte de vida, que procede do Pai e do Filho, e com o Pai e o Filho é adorado e glorificado.

Dividido em três partes, o símbolo só tem lugar quando devolvido ao seu estado original. Não basta crer só no Pai, nem só no Filho ou no Espírito Santo. Também não adianta crer mais em um que nos outros.

Também estamos partidos se nossa crença não está pautada aqui na profissão de fé cristã, o Símbolo dos Apóstolos.

Interessante contradição. Disse [e é verdade] que a profissão de fé é feita na primeira pessoa do singular. Mas também deixei claro que eu não creio em qualquer coisa, mas naquilo que a Igreja crê. Note que também estou partido e só sou cristão quando unido a comunidade.

Eu creio naquilo que a comunidade crê, naquilo que os apóstolos passaram, naquilo que Cristo ensinou.

Daqui se absorve a última parte do credo na Santa Igreja Católica, na comunhão dos santos, na remissão dos pecados, na ressurreição dos mortos, na vida eterna.

E você? Está em consonância a crença da Igreja ou você se acha católico? Em que você crê?

Não se esqueça que o símbolo partido pode significa a morte.

Amém?